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Florença romana

Quando a gente caminha e admira toda a beleza de Florença costuma associar tudo o que vê principalmente ao Renascimento.  Embora poucos saibam, Florença nasceu bem antes da Idade Média e do Renascimento, períodos pelos quais é mundialmente famosa.   Apesar de testemunhos muito antigos, ainda de época etrusca, Florença foi fundada no século I antes de Cristo.  A data exata é uma dúvida, alguns historiadores atribuem à Julio Cesar no ano de 59 AC e outros à Augusto, o primeiro Imperador Romano, que a teria fundado entre os anos 30 e 15 AC.  A cidade foi chamada de Florentia, em homenagem à deusa Flora e ao período de sua fundação, em plena primavera, mês das flores.

Florentia foi fundada na margem direita do Rio Arno e havia uma ponte que ficava próxima ao local onde hoje encontramos a Ponte Vecchio

A cidade de Florentia tinha um traçado urbano típico romano, baseado no acampamento militar, chamado castrum. No acampamento fortificado  havia o fórum,  bem  ao centro da cidade,  o Capitólio, uma   fullonica, as termas e um anfiteatro,  que era sempre construído mais afastado, fora do centro.  Infelizmente  não ficou quase nada de época romana na cidade, é preciso saber exatamente onde ir para poder testemunhar o passado romano em Florença.  Muito acabou sendo  destruído  durante as obras de “Florença-Capital”, no século 19.

O traçado da colônia  seguia o  modelo clássico de urbanismo romano, desenvolvendo-se numa área retangular, orientada pelos pontos cardeais e rodeada por muralhas defensivas (imagem internet por Rachel Valle)

 

A delimitação das muralhas  na parte norte da cidade romana ficava na correspondência onde hoje encontramos o Duomo e o Batistério.  Existem dúvidas sobre a estrutura do Batistério e sua fundação, segundo uma tradição florentina,  em época romana, aqui ficava um Templo dedicado à Marte

Teatro romano
Parte do Palazzo della Signoria, ou Palazzo Vecchio, foi construído sobre o grandioso teatro de época romana.  O teatro romano era muito grande, provavelmente com capacidade para abrigar cerca de 15 mil pessoas e abrangia a  área que fica à esquerda de onde hoje fica o Palazzo Vecchio, parte da área do  Palazzo Gondi  até a praça San Firenze. O antigo teatro foi realizado aproveitando a inclinação  natural do terreno. Um dos poucos pontos da cidade onde podemos testemunhar os restos do teatro é no subsolo do Palazzo Vecchio. As escavações arqueológicas permitiram trazer à luz os restos de algumas partes do teatro romano, conservados  aqui no subterrâneo. Numerosas evidências arqueológicas emergiram das escavações realizada nos anos 80 para repavimentação da praça.

Um dos poucos locais onde podemos testemunhar os restos do teatro romano é no subsolo do Palazzo Vecchio. O teatro tinha capacidade para até 10.000 pessoas

Na área que atualmente corresponde à Praça da Signoria haviam um spa e uma fullonica, para lavagem e tingimento de tecidos

O antigo fórum romano

Em época romana, na praça da República existia o fórum, com o Templo dedicado à Tríade Capitolina. O fórum era  a praça mais importante de todas, era o centro político, administrativo, religioso e comercial das cidades romanas.  Exatamente onde fica a Coluna da Abundância delimitava o centro exato da cidade,  o ponto de união das duas estradas principais, o Cardo e o Decumano.

No local onde encontramos a Coluna da Abundância  marcava o ponto central da cidade. A coluna marca o cruzamento dos 2 eixos,  o ponto de união das duas estradas principais, o Cardo e o Decumano

 

Termas

Os romanos adoravam frequentar os  banhos públicos ou as termas. Esses edifícios eram locais que proporcionavam todo  tipo de entretenimento, com jardins adornados com estátuas onde se podia caminhar,  fazer ginástica, massagem e praticar esporte.   Alguns locais aqui em Florença, além dos banhos termais Capitolinos (perto do Campidoglio, na praça da Republica), haviam os banhos termais onde atualmente encontramos a Torre della Pagliazza, na Praça Santa Elisabetta,  e nas proximidades da piazza del Limbo, nas ruas delle Terme e Borgo Santi Apostoli.

Paralela à essa rua, temos a via delle Terme, que lembra os antigos banhos romanos, que aqui se localizavam. O edifício restaurado lembra com suas escritas o passado de época romana

 

Outro local onde ficavam os banhos termais é onde encontramos atualmente a Torre della Pagliazza , na piazza Santa Elisabetta

 

Anfiteatro

Outra área  muito interessante da Florença romana é, sem dúvida, a de Santa Croce, em particular a modo a  pequena Piazza dei Peruzzi, que tem a particularidade de ter palácios assentados sobre as ruínas do anfiteatro romano, o que lhes confere um traçado típico elíptico. E a poucos passos da praça Peruzzi fica a  Via Torta, que marca o perímetro do antigo anfiteatro.  Como acontecia nas cidades romanas, o anfiteatro fora construído mais afastado do centro, fora das muralhas e tinha capacidade para ate 20 mil pessoas.  As estruturas medievais  dessa área da cidade, que inclui a Piazza Peruzzi, via Bentaccordi e via Torta, seguem perfeitamente a curvatura elíptica do antigo anfiteatro.

O anfiteatro romano – A escolha do local foi nos limites da área urbana,  nas proximidades da atual Praça de Santa Croce

 

Quando foi feita a reestruturação  em Florença no século 19, algumas ruas foram nomeadas  conforme o que foi encontrado na época da renovação da cidade, como via Del Campidoglio, via delle Terme e Via del Capaccio, onde terminava o aqueduto que abastecia a cidade,  através de um sofisticado sistema de água que começava no Monte Morello

O aqueduto
O aqueduto romano de  Florentia partia das nascentes do Monte Morello e terminava o percurso na Via di Capaccio,  nas proximidades do atual Mercato del Porcellino.
Cemitério

As áreas do cemitério de Florentia eram ao longo das estradas principais. Uma das maiores necrópoles localizava-se ao longo do trecho da Via Cassia e os vestígios  vieram à tona no século 16 , durante as escavações da construção da Fortezza da Basso, nas proximidades da estação ferroviaria de Santa Maria Novella, e alguns séculos depois  com a construção da ponte ferroviária al Romito.

 

 

Florença no tempo das casas-torres

Havia uma grande quantidade de casas-torres no cenário da Florença do século 13. A torre era não apenas a habitação, mas também símbolo da força das famílias nobres e indicador da posição econômica. Na Idade Média a vida política era conturbada e existiam muitos conflitos violentos, onde famílias nobres e suas facções se desafiavam pelo poder, como os guelfos e ghibelinos, e a casa-torre garantia  segurança para as famílias, que podiam se refugiar durante os ataques dos inimigos. Eram as casas de nobres ou mercantes  ricos, já que esse tipo de construção era muito cara e acessível apenas à uma parte  da população.

Na Idade Média  haviam cerca de 150 casas-torres em Florença.  Era a habitação principalmente de ricos mercadores florentinos, uma espécie de forte defensivo

Algumas torres, sobretudo aquelas pertencentes à mesma família ou à famílias aliadas,  estavam ligadas por uma passagens de madeira, uma espécie de ponte,  oferecendo dessa forma uma melhor comunicação em caso de confronto.

Em época medieval o cenário era bem diferente do que encontramos hoje em dia

Em Florença existiam cerca de 150 casas-torres, com altura entre 50 e 70 metros, e atualmente poucas ainda estão de pé.  Algumas dessas torres foram destruídas ao longo dos anos durante as guerras internas.  No século 19, quando  foi criado o novo plano urbanístico da cidade, muitas foram demolidas ou incorporadas em construções de um período posterior.

Atualmente restam cerca de 50 torres, que estão camufladas no tecido urbano moderno

No centro de Florença encontramos ainda inúmeras torres que sobreviveram a guerras civis, demolições e renovações, sendo que algumas foram incorporadas em palácios e em edifícios, e nem todas são reconhecíveis imediatamente. Quando começaram a surgir os municípios, no século 13,  as torres foram cortadas, como forma de mostrar que o poder das famílias nobres havia acabado e o palácio começou a  simbolizar o poder de uma família, e não mais a torre.

Come eram as casas-torres?
As casas-torres serviam como abrigo e ao mesmo tempo eram instrumento de controle e  vigilância territorial.  As torres apresentavam uma estrutura  compacta e eram geralmente   desprovidas de aberturas, com exceção de algumas lacunas, que em italiano é chamada de “feritoia”,  que significa uma pequena abertura feita na  estrutura fortificada.

A Torre de Manelli, na Ponte Vecchio

As aberturas para o exterior eram limitadas não apenas  por uma questão de defesa contra ataques inimigos mas também devido ao clima,  já que  naquela época, o único tipo de aquecimento era o fogo e evitava-se ao máximo  contato com o exterior para não diminuir a temperatura interna. Por esse motivo as casas eram muito  escuras.  E por segurança, as entradas localizavam-se não no nível da estrada, mas no topo, no primeiro ou no segundo andar, acessíveis por escadas móveis de madeira ou por meio de passagens acessíveis  pelo interior dos outros edifícios.  Para maior segurança,  haviam as escadas de madeira nessas min-fortalezas que eram removidas à noite.

A Torre dei Belfredelli, no Oltrarno. As casas-torres levavam o nome das famílias as quais pertenciam

As construções eram adequadas para a defesa em um período anterior ao desenvolvimento da artilharia, quando a defesa era realizada principalmente com arremessos

Em caso de ataque, eram colocadas tábuas nos pisos superiores que ligavam as casas-torres mais próximas entre si para facilitar a fuga dos habitantes em caso de necessidade

As construções eram adequadas para a defesa em um período anterior ao desenvolvimento da artilharia, quando a defesa era realizada principalmente com arremesso, portanto, a ação de cima era necessária. Eram construídas em tijolo ou em pedra e  apresentavam janelas estreitas. Dependendo da atividade do proprietário, o porão da torre podia servir de depósito de materiais utilizados para o trabalho e no térreo eles desenvolviam suas atividades. No andar superior, chamado nobre, ficavam os dormitórios e, devido ao risco de incêndio, a cozinha ficava no andar mais alto.

Uma curiosidade, a cozinha ficava sempre  na parte mais alta da casa devido ao cheiro e ao risco de incêndio

 

No Davanzati tinha até banheiro, algo muito raro. Sim, é verdade que em época medieval as “necessidades” eram despejadas nas ruas

Museu Davanzati

E para quem quiser saber como é uma casa-torre,  pode visitar o Museo della Casa Medioevale Fiorentina, conhecido também como Palazzo Davanzati,  uma típica residência nobre florentina de época medieval, preservada quase intacta. Adoro esse museu e o recomendo, principalmente para quem viaja com crianças.

Um poço numa antiga casa-torre, no Palazzo Davanzati

 

Casa-torre

O edifício que abriga o Museu Casa de Dante não é uma construção de época medieval, mas uma reprodução do início do século 20

Gostou de saber sobre as casas-torres de Florença? Nao deixe de conferir o post sobre San Gimignano,  a Manhattan da Idade Média.

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